domingo, 15 de novembro de 2009

4 - Girls just wanna have fun



I come home in the morning light
My mother says when you gonna live your life right
Oh mother dear we're not the fortunate ones
And girls they wanna have fun
Oh girls just wanna have fun

Após alugar o carro, um conversível desses antigos, de cor clara, saímos pela Cidade do México. Era maravilhosa, cheia, populosa, com pessoas e belas paisagens passando por todos os lados. Hospedamo-nos num pequeno hotel, simples, que satisfazia nossas necessidades. Além disso, financeiramente, podíamos arcar com ele. Afinal, estávamos apenas no início daquela longa e louca jornada.
- Cara, tem uma salinha de jogos! – Gritei entrando em nosso quarto.
- Sério? Uau. – Layla me respondeu sarcasticamente, enquanto arrumava alguns de seus pertences no pequeno armário de madeira.
- Sério, Lah, vamos jogar e beber? Nossa primeira noite no MÉ-XI-CO, temos que comemorar! – fiz uma dança animada com castanholas imaginárias.
- Vamos, vamos! – Ela finalmente se animou. – Daqui a quinze minutos é hora de descer para o jantar.
- Ah, foi porque eu enfatizei o beber, não foi? – Dei um tapa carinhoso em suas costas.
- Vou tomar um banho. – Ela saiu sorrindo.
Liguei a televisão para ver a programação. Eram só pessoas falando com aquela lingüinha presa, tipicamente mexicana, diferente dos espanhóis, argentinos e derivados. Como não me interessei por nada, resolvi ligar para a recepção:
- Hola! – Segurei o riso.
- Hola, senhorita. – O mexicano do outro lado achava que estava falando com uma hospede normal.
- Sim, que o tem na programação de hoje? – Enrolei a língua e saquei de um espanhol muito mal falado, que foi entendido.
- Hoje teremos um jantar com a presença de “Los MARIACHIS” do hotel, senhora. Um romântico e famosíssimo espetáculo mexicano. Perfeito para a senhorita e seu “novio”.
- Ah. – bufei. – Eu não tenho “novio”! – Reclamei, quase completando com “mexicano idiota”.
- Tem muitos rapazes solteiros em nossos jantares, senhorita. Parece que você veio para o lugar certo, senhorita.
- Ah, agora você ta falando a minha língua. Mas eles são “guapos” mesmo? – Ri pois Layla saía do banheiro, com uma toalha amarrada na cabeça, com uma das mãos sobre a boca, escondendo o riso por minha fala.
- Sí, Sí, senhorita. – O recepcionista respondeu. Layla continuou me fitando.
- Então é isso. “Muchas Gracias”, senhor. – Desliguei o telefone; Ela caiu na cama, rindo de minha conversa.
- No mínimo ele vai achar que você é uma tarada! – Ela disse em meio às gargalhadas.
- Ou não. Ele quem começou! – Protestei, sem achar graça. – Tá, vou tomar meu banho.
- Vou me comportar, diferente de você.
- Sarcástica você, Lay, chata.
Descemos para o jantar. Era uma sala pequena, porém aconchegante e parecia que todos os hóspedes já estavam presentes. No fundo, três homens, um com um violão, vestidos da mesma maneira, de vermelho e com grandes bigodes negros, tocavam músicas que mais me faziam rir que me sentir apaixonada. Cutuquei Layla com meu cotovelo e trocamos olhares os quais significavam: “vergonha alheia”. Sorri quando o recepcionista, que – pasme! - era “guapo”, veio falar conosco.
- Hola! – Ele disse sorridente. Provavelmente com décimas segundas intenções.
- Hola! – Respondemos em coro, com sorrisos nitidamente falsos.
- Sintam-se em casa. – Ele abriu espaço para passarmos.
Quarenta minutos, cem tequilas e duzentas risadas graças aos Mariachis depois, já havíamos jantado uma combinação de diversas iguarias mexicanas, tais como tacos e chilli, trazidos especialmente pelo nosso recepcionista, que se revelou um atencioso maitre. Atencioso até demais, como diria Layla.
- Sério, você é a Medusa! – Layla começou, já com voz de bêbada.
- Não, não sou não. – Falei seriamente, apesar da voz tremula.
- É sim! Os caras te olham e viram pedra! – Agradeci a Deus por estarmos num país desconhecido onde ninguém entendia nossas falas.
- Quero seu mel, Alice. – Disse piscando para mim.
- Não tenho mel nenhum. – Continuei aparentemente séria, mesmo que tentasse esconder um risinho das loucuras de minha companheira de viagens. Se sóbria sua criatividade já era aguçada, bêbada então... Admito, já estava meio louca por causa de todas aquelas bebidas.
– Não vou comentar... – Encerrando o assunto e rindo sem motivo. Acompanhei minha amiga, achando graça de algo que nem eu mesma sabia o que era.
Na outra parte do salão, havia dois homens sentados numa mesa, bebendo e conversando cordialmente, como amigos normais. Era notável a diferença entre mim e Layla e eles. Nós, quase espalhafatosas, irradiando brilho e chamando atenção da maioria de sexo oposto presente. Eles deviam falar sobre algum assunto banal, entre goles de cerveja enquanto seus olhos passavam por todo o espaço, talvez em busca de uma bela mexicana para uma diversão à toa.
Certa hora, desliguei-me das bobeiras de minha mesa e viajei pelas outras do restaurante. Meu olhar se cruzou com o de um dos tais homens, este, nitidamente mais velho que o outro, possuía olhos lindamente esverdeados. Na verdade, não sei exatamente a cor. Talvez eu tenha idealizado e a imagem ficou em minha cabeça. Talvez sua pele morena, queimada de sol fizesse com que seus olhos ficassem mais claros e hipnotizantes.
- Lá vai você envenenar mais um... – De repente, interrompendo meu contato visual, Layla disse com tom de bêbada resmungona.
- Que? Ele quem está olhando pra cá. – Retruquei.
- Porque você não para de olhar pra lá, fica chamando. – Disse ela, entre goles de seja lá qual for a milésima bebida do dia.
- Ok, vou parar. Mas dá uma olhada no amiguinho dele... Seu estilo, não?
- Hum... – Ela virou-se com charme para o lado oposto do salão de jantar. O rapaz, também bronzeado, diferente do moreno mais velho, tinha cabelos dourados e olhos verdadeiramente claros “não era de se jogar fora”, como foi constatado por Lah.
- Safada! –Gritei e chutei seu pé com delicadeza, por baixo da mesa. Ela riu.
- You won’t admit you love me. And so how am I ever to know? You only tell me… - Layla cantarolou com uma voz mais grave que a normal, se é que era possível ela engrossar sua voz fininha, quase de criança.

- Quizas, quizas, quizas - Completamos juntas. Ao final das risadas (para variar), eu disse:
- Sempre, né? Para mudar de assunto você canta essa música. Você é figura, Lah. – Minha amiga bêbada caiu na gargalhada e logo mudou sua feição:
- Não sou não. – Disse com ar de desanimada, típico de bêbados.
- Você é sim, não discute comigo, sua bipolar.
Os olhos do homem de cabelos pretos, levemente compridos, ainda me perseguiam. De alguma forma, ele me atraía e não conseguia ficar sem ao menos olhar disfarçadamente para a mesa dos amigos estrangeiros. Disfarcei um risinho bobo ao desviar seus olhares.
- Ei, vamos para o salão de jogos? – Layla resolveu se manifestar. - Eu não agüento mais esses “Maricas” ou seja lá qual for o nome mexicano deles.
- Mariachis, Layla... Como fomos esquecer a sala de jogos? – Disse sarcasticamente.
- Aqui é muito certinho, temos que bombar amanhã! – Ela se levantou da mesa com ar animado.
- Sim, sim. – Respondi, com a visão bem tonta ao levantar.
- Temos que conhecer o lado podre do México; - Ela começou
- Provar todas as bebidas; - Completei
- E, mais importante, provar todos os mexicanos! – Layla mostrou seu lado tarado. E desandamos a falar até chegar à tão aguardada sala.
Aparentemente todos os hóspedes do hotel preferiram os Mariachis, uma festa ou Luta Livre, pois a sala estava abandonada. Acendemos as luzes e entramos pela porta de madeira que fez barulho típico de casa mal assombrada. Era um pequeno recinto, com uma mesa de sinuca, uma maquina de bebidas e um jukebox no canto. Além disso, havia algumas mesas para jogos tipo poker, damas, dominó, jogos de baralho em geral.
- Uau, adoro esses lugares. – Fiz o reconhecimento do local.
- Sim, é perfeito. – Ela sorriu, partindo em direção da máquina de cervejas.
- O que vamos jogar? – Perguntei, passando por ela e seguindo até o Jukebox.
Layla atirou uma garrafa de uma cerveja mexicana para mim, dizendo:
- Sinuca?
- Ok. Ah, olha essa música! – Apertei o ‘play’ e a poderosa voz de Dean Martin invadiu a pequena sala, com ‘That’s Amore’.
- Ah, eu amo! Sempre me imaginei num restaurante, dançando com um chef de cozinha. – A sonhadora disse. Eu ri e completei:
- Temos um chef a nossa disposição lá no restaurante, se você quiser...
- Não, o do meu sonho é mais “guapo”.
Parecíamos dois homens bebendo cervejas e jogando sinuca na madrugada de uma noite linda na Cidade do México. Acabei esquecendo os olhos lindos do quarentão que eu havia visto. A cada gole, a realidade ia ficando pra trás. Não me lembro se sonhei certos fatos ou se realmente aconteceram.
- Sabe o que eu sempre quis fazer numa mesa de sinuca, Lah?
- O que?
- Sexo. – Eu ri. – Sério, mas nunca tive a oportunidade.
- Eu te ajudaria se pudesse... – Ela disse sarcasticamente entre goles.
- Engraçada, Layla. – Taquei acertando a bola branca na de cor verde que entrou no buraco.
- Yeah! – Comemorei. Lah fez pouco caso:
- Você tem um cigarro?
- Tenho.
- Aqui, ó. – Estiquei o braço com um cigarro na mão.
- Valeu, Ali. Agora você verá a bola preta dizer tchau. – Ela disse com pose de jogadora profissional, com o taco em pé ao lado de seu corpo.
- Tá bom, Lah. Veremos. – Digo, acendendo um cigarro enquanto espero sua tacada.
A porta rangeu antes que Layla pudesse se posicionar para jogar, parecia que teríamos companhia. Rapidamente, ajeitamos os cabelos, pousamos as garrafas na mesa e apagamos os cigarros. Entreolhamo-nos, como sempre. Ao abrir a porta, adivinhe? Os olhos mais perfeitos da face da Terra entraram. Eu não via nada alem daqueles faróis levitando em minha frente. Não escondi o sorriso.
- Boa noite, meninas. – A voz do coroa, num inglês bonito e não identificável ecoou na saleta.
- Boa noite. - Respondemos em coro.
- Podemos nos juntar a vocês no jogo? – Desta vez foi o rapaz quem deu o ar de sua graça, numa voz grossa e atraente.
- Claro. – Eu disse sorrindo, sem desviar dos olhos que me hipnotizavam.
- Meu nome é Russel, prazer. – O jovem-de-cabelos-dourados-e-de-olhar-sexy disse, estendendo a mão especialmente para Layla.
- Layla. – Ela o cumprimentou de forma doce, até onde a bebida a deixava ser tímida.
- John, mas todos me chamam de Gibson. – O quarentão virou-se para mim enquanto o rapaz pegava bebidas na tal máquina.
Agora a música era ‘Volare’ e digamos que a sala ficou mais interessante com a presença dos dois. Passamos a jogar e beber juntos, os quatro, como dois casais numa viagem informal. Para acertar a bola, o Sr. Gibson passou por mim, com um olhar pouco discreto. Ele tinha um bigode e cavanhaque, que me lembrou o Capitão Jack Sparrow. Além disso, cheirava como imaginamos que aqueles homens de comercial de perfume cheiram, divinamente bem.
Quando percebi, já estava rindo das conversas de Gibson e havia me esquecido da presença de Layla e Russel naquele lugar.
- Somos das Bahamas. Trabalhamos juntos no ramo de turismo. E vocês?
- Brasileiras.
- Que ventos as trouxeram para o México?
Poderíamos dizer “uma sede de loucuras, de intensidade para a vida”. Porém, nos contivemos em:
- Férias.
Naquele misto de jogatina, músicas que nos deixam com vontade de sacar um europeu ou um bahamense gato no bolso e dançar junto a seu corpo até o amanhecer, acabei deixando-me levar pelas circunstancias. John já havia virado um pirata em meus sonhos e a razão pela qual aquela pequena sala balançava a meu ver, eram as ondas do mar naquele navio onde aparentemente éramos a tripulação. Layla e Russel já estavam bem entrosados. Eu percebi o tapa-olho em um dos olhos do belo rapaz e o vestido velho de minha amiga, como o de uma rapariga viajante. Decidi então que eu deveria me jogar em cima de Gibson, pois eu sempre quis ter um affair pirata. E é até esse momento que tenho plena consciência dos fatos como realmente foram.

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