quarta-feira, 4 de novembro de 2009

2 - Be Somebody

Given a chance, I'm gonna be somebody If for one dance, I'm gonna be somebody Open the door, it's gonna make you love me Facing the floor, I'm gonna be somebody


Enquanto dirigia até nossa casa, pensava naquilo tudo. Seria loucura mesmo sumir do mapa daquele jeito? Bom, piorar não podia. Às vezes bate uma súbita responsabilidade, que some quase instantaneamente. Olho para minha vida e percebo que realmente precisamos evaporar por uns tempos: esquecer amores, familiares enchedores de saco, o fracasso no trabalho... Quando me projetava aos 22, era tudo glamour, uma mulher bem sucedida, com um namorado fixo, reuniões de família aos domingos e festas intermináveis às segundas. No entanto, depois de escrever, atuar e editar um filme sobre como definir todos os tipos de amor que sentimos, minha carreira não decolou. O Math, amigo quem dirigiu meu roteiro, me abandonou e está morando em Nova York, “tudo pelo cinema”, como ele diria.
‘Kings of Leon’ no rádio, essas músicas me deixam depressiva. Essa cidade está um inferno de tão quente. O transito, um caos. Meu cabelo, uma palha. Meus cigarros, acabando. – Tenho que parar. Dizem que quando chegar aos 30, fumando desse jeito, minha pele estará como a de uma coroa de 50.
Se eu tivesse vindo a pé, tudo estaria bem. Layla é a culpada, por que insistiu que eu ficasse com seu carro até hoje de manha, pois ela não estava “tecnicamente bem para dirigir”. Ai, Layla... Passamos o dia de ontem inteiro planejando a viagem e minha amiga decidiu que ficaria bêbada, sem motivos, “só para desopilar”. Pior! Ela me levou junto e como eu não sei ver defunto sem chorar... Deu no que deu. De madrugada, quando minha consciência “apitou”, deixei-a em casa e segui para a de minha mãe – desobedecendo a lei seca, eu sei. Já que ia sumir por uns tempos, sem dar noticias, devia fazer uma média com meus pais.

Apesar das loucuras – são tantas! – nós nos entendemos de verdade. Diriam até que somos irmãs, de tão parecidamente chatas.
Ela mexe com moda. Trabalhava na redação de uma revista, por algum motivo, saiu de lá. Quando tinha 17, sonhava em ser uma Miranda Priestly, editora de revistas que só vêem cara, esquecendo-se do coração, mas não deu certo.
Faltava atravessar duas ruas até a casa dela, quando meu celular tocou:
- Alô. – disse sem entusiasmo.
- Minha filha, cadê você? – Era Layla.
- Tô indo, tô indo... Você sabe como eu odeio o transito de sábado de manhã; bando de farofeiro indo pra praia. – Digo mal humorada.
- Manhã, Alice? São 2 da tarde!
- Eu fui dormir tarde, chatinha. Se eu me lembro bem, você também...
- É... – Ela mudou de assunto - Bom, está tudo pronto. Só falta você.
-Ok. Te vejo em 10 minutos. – Com o silêncio do outro lado da linha, percebi que ela sorria. Ri também.
- Tá, beijo.
Encontrei com ela já na portaria, com nossas malas a postos. Layla, com um belo chapéu branco, a lá Carrie Bradshaw em dias de férias com as amigas, parecia uma turista chique. Eu ri, porém Lah não percebeu, tamanha era sua ansiedade. Veio correndo em minha direção, quando estacionei o pequeno carro na calçada em frente ao prédio:
- Ali! Vamos, vamos! – Ela abriu um sorriso do tamanho do mundo, quando enfiou a cabeça pela janela do carro. Nunca tinha visto Lah tão empolgada. Um ventinho tímido, depois de o calor ter quase me matado naquele engarrafamento, surgiu. Parecia uma mensagem subliminar: as coisas melhorariam.
- Oi, Lah. Ou eu deveria dizer Carrie? – Perguntei sarcasticamente.
- Não entendi... – Ela botou as mãos na cabeça, segurando o chapéu, impedindo que o vento o levasse voando.
- Você esta “fantasiada” de Carrie Bradshaw ou é impressão minha? – Caí na gargalhada.
- Ai, sua chata! – Ela se emburrou. Sempre que eu fazia piadinhas sobre seu estilo, era motivo para magoas.
- Oh, é palhaçada, né, Layla, você está linda, como sempre, Miranda. – Saí do carro. Ainda de braços cruzados, ela olhou meu figurino e não se segurou:
- Melhor ser a Carrie que ser metida a roqueira... – Rimos juntas, a magoa tinha passado.
Pegamos um taxi, com direção ao aeroporto. Não sei por que sempre acabávamos atrasadas para tudo!
- Sei que eu não devia dizer isso, mas você ta me lembrando a Audrey, na época de “Bonequinha...”. – Ri, sabia que ela iria ficar convencida com esse comentário.
- Apenas Audrey, né? – Amo o “apenas” de Layla.
- Sim, “apenas”. – Sorri - Até que suas aulas deram resultado...
- E você... Essa blusa do Motley Crue, meu deus, Alice, ela vai criar asas de tanto que você a usa! Além disso, está toda surrada. – Ela ignorou meu comentário.
- Ah, não começa... Foi presente do Pedro, você sabe, ele foi...
-“Meu amigo-namorado, roqueiro e super cool, bla bla bla” – Layla me interrompeu, fazendo uma voz mais fina que a sua normal.
- Eu amo essa blusa, tem significado pra mim. Talvez tanto quanto essa tatuagem aqui. – Mostrei o desenho em eu braço.
- Eu sei. – Ela me abraçou – Mas você definitivamente precisa de uma estilista: EU! – Gargalhei junto a ela.
- Ah, talvez, Lah, mas não que eu precisasse de belas roupas na hora de seduzir os homens. Se é que você me entende... – Pisquei um dos olhos. Rimos juntas até chegar ao aeroporto. Vi pelo espelho que o taxista ria de nós. É, todos sempre riem de nós.

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